quarta-feira, 28 de novembro de 2007

O POVO - [Artigo] Não vem não

O presidente da ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República), senhor Antônio Carlos Alpino Bigonha, vem de contribuir com uma pérola para o já pobre debate político-institucional brasileiro: advoga um incerto e difuso controle externo da valorosa Ordem dos Advogados do Brasil. Esquece que a OAB não gere dinheiros públicos, sendo mantida única e exclusivamente pelas contribuições de advogadas e advogados, nisto residindo a sua independência, essencial à consecução de suas importantes finalidades sociais. A OAB não pode nem deve render contas de seus atos aos donos do poder. Ao revés, tem-se credenciado como o olhar vigilante e indormido da sociedade sobre a res pública, não tendo hesitado, ao longo de sua história de mais de setenta anos, em denunciar os abusos cometidos pelas instâncias formais de poder. O movimento cívico pelo fim da ditadura estadonovista, o repúdio ao nefando Tribunal de Segurança Nacional, as lutas nacionalistas da década de cinqüenta do século passado, o movimento pelas diretas-já e a deposição de um presidente acusado de corrupção pelas vias constitucionais do impeachment, constituem páginas luminosas de uma trajetória de compromisso intransigente com o estado democrático de direito. Essas lutas, é certo, não se travam sem resistência. Vira e mexe a tentação autoritária, como parece acontecer agora, arreganha a dentuça e mostra sua cara feia. Buscar controlar esta que é, mercê dos esforços e abnegação de várias e várias gerações de advogados brasileiros, uma das mais importantes e acreditadas entidades de defesa da sociedade civil, que tem dentre suas atribuições a defesa da Constituição, da democracia, os direitos humanos, a justiça social, a rápida administração da justiça, o aperfeiçoamento das instituições jurídicas por disposição do artigo 44, inciso I, da lei federal 8.906/94 - Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados, é atentar contra a liberdade de associação e de ação política da cidadania organizada. Um golpe em cheio na democracia a duras penas conquistada. Que os exemplos nada nobilitantes de Torquemada, o acusador da Inquisição católica; de Fouquier-Tinville, do Tribunal do terror do jacobinismo da França revolucionária e de Vyshinsky, o terrível promotor público dos expurgos de Stalin, não se percam nas brumas do tempo. São a lembrança do mal que podem causar ao povo aqueles que, acreditando pairar acima do bem e do mal e deter a verdade absoluta, investem contra as liberdades públicas. A OAB é um dos porta-vozes da sociedade, por ela é aplaudida e respeitada. Sujeitá-la aos humores dos poderosos do momento é solapar a sua independência, sufocar a sua voz altiva e não raro solitária. É um desserviço à causa do povo brasileiro. Hélio Leitão - Presidente da OAB-CE